BAÚ DO RANCHO


Hoje eu decidi falar de uma coisa muito gostosa e que a gente consegue saborear por uma boa parte da vida, mas que não é algo de comer. Esse post é dedicado especialmente à minha avó...
Quer coisa mais gostosa?
Vão completar cerca de 8 meses que minha lindinha faleceu. Seu nome fazia jus à pessoa: Palmira, vindo do latim, relativo ao fruto doce.
Como eu ainda não tenho 88 anos de histórias pra contar, vou começar pelos 33 que eu passei com ela...



O meu avô por parte de mãe se chama José, e na realidade,os filhos nunca aparentaram gostar muito dele até ele envelhecer, pois segundo a longa história da família, ele casou com minha avó, judiou muito dela com as amantes que ia conquistando, aprontou algumas boas, até que por decisão própria saiu livre para a vida da rua. Isso acabou concebendo uma separação, que com certeza, para a época foi bastante condenável e sofrido para minha avó, que teve de lutar para criar os 6 filhos sozinha. Mulher forte, rude, batalhadora, que acabou por criar as filhas mulheres as mais duronas, aquelas que enfrentam tudo de frente, sem reclamar e com muita fé.

Parecem ser milagrosas, ou donas da magia e de uma boa porção do pó de PIRMLIMPIMPIM, pois resolvem tudo que é problema!!!

Então foi que eu nasci, e a paixão enorme pela avó me fez viver uma vida bastante gostosa, simples e carinhosa ao lado dela e de meus pais. Eu me sentia completamente dividida, pois amava minha casa, mas estar com a vó tinha um calor especial, um desejo de não descolar dos mimos e do colinho dela.

Com ela, eu dei os meus primeiros passos na cozinha. Aprendi a fazer pão, pudim, arroz, feijão, o que chamavam de "mistura" para as refeições, doce de banana em pedaço, geladinho de coco queimado... Aprendi até enrolar bob nos cabelos, pintar as unhas e organizar a casa.



Ela era o tempero de tudo ao meu redor.

Mas como tudo o que é mais importante a gente deixa pro fim, nesse post não poderia ser diferente. Quero apresentar a vocês a pessoa que se tornou a coisa mais gostosa e especial da minha vida: a vovó Palmira.

Doce no nome, no rosto, na essência. Posso dizer que ela ajudou minha mãe me criar. Sabe, aquela senhorinha com cara de vovó, pois é. A dona Palmira era assim, sempre fazia de tudo para proteger a cria, a netinha, não adiantava mexer comigo não, porque ela defendia sempre, o que criava muito ciúmes nas outras netas, por nossa afinidade.

As lembranças mais marcantes que eu tenho dela eram as orações que eu a ouvia fazer ao acordar e deitar, a santinha que carregava no sutiã, o espírito criança de passar trotes no telefone comigo e morrer de gargalhar, os chocolates que escondia no guarda-roupa para juntas comermos na hora da novelinha das seis da rede globo, os armários da madrinha que fuçávamos juntas para ver as novidades que esta trazia das viagens ao México, as lancheiras gostosas que ela arrumava para eu levar na escola, e tantas outras... Assim bem como os carinhos que ela me fazia no cabelo quando deitava a cabeça em seu colo e as histórias lendárias que me contava, que não foram poucas.



Era ela quem me ditava os textos para passar a limpo nos meus cadernos da escola. Juntava as moedas ou “pratinhas” para me ajudar a pagar as miudezas escolares e os doces de bar que eu amava.

Ela se preocupava com todo mundo, mas de fato, eu era a mais protegida e querida.

Os cheiros sempre foram uma característica marcante da vovó Palmira. Se eu começar pela cozinha, posso dizer que a dela sempre tinha um cheirinho de café, de pudim ou de gelatina. Macarronada com almôndegas era o cheiro tradicional do domingo. Além dele, havia sempre bolinhos de arroz e bife (eu torcia sempre para que eles fossem feitos a milanesa). Sabe aqueles biscoitos importados, amanteigados e embalados em latas decorativas? Para mim, eles ainda têm gosto de natal com a vovó. É que ela adorava e sempre dividia comigo os que ela ganhava nessa época do ano.



Ela amava ir no supermercado, comprar coisas de lata, comia com os olhos...coisas que nunca pode ter quando trabalhou na roça.

Fora da cozinha, a vovó sempre usava uns cheirinhos meigos. Ela adorava sabonetes líquidos, cremes, talcos e perfumes suaves. E esse cheirinho sempre foi a minha desculpa para usar os perfumes e cremes que ela tinha no guarda-roupa.

Eu adoravaaaaa usar os cheirinhos dela.

Vovó vaidosa? Um pouco. Algumas vezes a vi reclamando das rugas e do cabelo sem corte. Nada muito grave. Mas ela não queria ficar velha, ganhar idade.

Mas se tinha algo que ela fazia questão, era de roupas floridas... como gostava!



Era bom andar com ela na rua, todos gostavam dela de graça, sem esforço… O sorriso estava sempre ali, a simpatia, a elegância da simplicidade e a doçura encantavam vizinhos, vendedores.

Vocês acham exagero? Perguntem então para qualquer pessoa tenha conhecido a dona Palmira. Até as minhas amigas a adotavam como avó, mesmo contra a minha vontade e eu morria de ciúmes dela.

Além da simpatia, ela não negava conselhos. Uma sabedoria simples e carinhosa que, aos poucos, se transformou em frases clássicas, que marcaram épocas e viraram receitas para a vida de muita gente:

"Se não está dando certo, entregue pra Deus que ele resolve”, “Nossa senhora te abençõe!”, “Está tudo certo, Deus sabe o que faz e a gente não sabe o que diz”. Doce, não?



Assim também são os cheiros, os gostos, as lembranças dela… Doces e ternas.

A dica que fica, depois de algumas experiências de vida, é sempre a mesma: saboreie as pessoas que você ama. Escolha os gostos, cheiros e sabores que você quer guardar na memória. Perder esse tempo é errar na receita e deixar passar o ponto.  E o tempo é um ingrediente que não se acha para comprar, mas dá pra dividir com quem vale a pena!



Minha vó foi minha mãe com glacê.


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2 comentários:

  1. Nossa mô, quanta doçura! Para falar a verdade, depois de tanto tempo casados, somente agora, lendo este post, é que conheci um pouco mais sua avó e também um pouco mais de você! Sei que as coisas doces da vida sempre marcam a gente, e com certeza deixam coisas boas, que devemos cultivar!

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  2. adoramos passear com voces beijos de todos

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